segunda-feira, 19 de março de 2012

O QUE SIGNIFICAVA SER ESCRAVO NO BRASIL? - DIÁLOGOS 2

Este post dá continuidade ao anteiror no qual apresento rapidamente o trabalho que estamos desenvolvendo com os 8os. anos sobre os significados do ser escravo no Brasil. Naquele texto também transcrevi algumas das questões que compõem os roteiros de investigação das turmas sobre o tema e solicitei ajuda (esclarecimentos, indicações de fontes de pesquisa, comentários sobre possibilidades de abordar o tema). Quem não leu os "comentários" dos professores Eduardo, Marcos e Rona não deixe de fazê-lo. Dois outros professores mandaram seus recados por e-mail: nosso amigo prof. Marcemino (EMEF Pe. Melico C. Barbosa) de cuja boniteza do trabalho muitos já pudemos desfrutar e a prof. Marina, professora da USP, que tem uma produção acadêmica e didática instigante sobre a "África e o Brasil africano". Transcrevo as contribuições abaixo e reitero minha gratidão pela disposição ao diálogo.

Caro Cláudio e alunos,
Sugiro que usem meu livro “África e Brasil africano”, para responder algumas das perguntas feitas. Procurem o site do LEMAD do Departamento de História da USP - lá vocês podem achar algumas indicações. Em breve teremos um site de apoio ao ensino, mas ainda está em elaboração. As perguntas feitas precisam de um curso inteiro para respondê-las. A escravidão é uma forma de exploração do trabalho tão antiga quanto a existência do homem em sociedade e teve diferentes características nos diferentes tempos e lugares. A colonização das Américas se baseou na exploração do trabalho de africanos escravizados devido a circunstâncias históricas ligadas à constituição de relações a partir do Oceano Atlântico. Os escravos são por definição estrangeiros
destituídos de direitos, forçados a realizar trabalhos pesados e sujeitos a castigos caso não façam o que lhes é mandado. A força bruta é a principal forma de submetê-los, o que não impede que se revoltem e fujam com frequência. No Brasil eles faziam todo tipo de trabalho, na lavoura, nas minas, nas cidades, nas casas. Eram muito variadas as formas dos senhores se relacionarem com os escravos, assim como os níveis de subordinação e autonomia deles, sendo que nas cidades tinham maior liberdade de movimentos e possibilidade de ganhar algum dinheiro para si, depois de pagar o que era exigido pelos senhores. Entre eles criavam formas próprias de se relacionarem e vínculos que uniam pessoas vindas de diferentes regiões da África. Famílias, ritos religiosos, festas, associações de trabalho eram espaços onde vivenciavam esses vínculos. Para ter uma idéia bastante minuciosa do que foi a vida dos escravos no Brasil, sugiro a leitura do romance “Um defeito de cor”, de Ana Maria Gonçalves. São quase mil páginas, mas de leitura muito agradável.
Cordialmente,
Marina
Claudio, tudo bem?
O percurso de pesquisa dos seus alunos é muito interessante, eles colocam perguntas que precisam ser colocadas sempre, por mais que os especialistas já tenham tentado responde-las. Sempre tive dificuldades para tratar desse assunto com os alunos, um certo receio de dizer a palavra “escravidão” porque me parecia uma ofensa aos meninos e meninas negros na sala. Como você bem sabe, há toda aquela invisibilidade das crianças negras na escola, as carinhas que enfeitam os cartazes espalhados pelas salas e corredores ainda são cor-de-rosa, “cor de pele”, como se diz, como se a cor preta estivesse fora dessa possibilidade. Quando os negros “aparecem” de maneira evidente é lá nos livros de História como escravos ou como povo exótico da África. A escravidão ainda é uma marca forte na cultura discriminatória e foi por isso que venho tentando substituir a expressão “escravo” por "escravizado”. Parece pouco, mas muda tudo: primeiro porque consigo ver a escravização como uma violência que ultrapassa o tempo e o espaço, atingiu e atinge pessoas sem distinção de “raça”. Tenho tentado trabalhar na perspectiva da “historia da escravização”, mas com o cuidado para não minimizar o tamanho dessa violência em relação aos povos africanos, mas na intenção de aliviar o peso histórico que isso implica.
Dias atrás apresentei algumas imagens do mundo antigo no oitavo ano e eles as “leram”
com muita facilidade, mas não conseguiram identificar essa imagem acima, que representa um menino escravizado amparando o seu senhor grego para que vomitasse direto no vaso após o banquete.
Grande abraço
Marcemino

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